Tempo para ler o mundo

Hoje acordei com tempo para ler o mundo.

A aluna faltou, a live foi postergada, a conversa com a amiga foi remarcada e o filho já fica até mais tarde na escola. Me sobrou tempo. Entre o tempo ‘grosseiro’ de um supermercado e o tempo ‘sutil’ de um cafezinho com biscoito me dei conta que eu estava diante desse hiato: um tempo para ler o mundo.

Andava buscando um espaço-tempo que me trouxesse plenitude, a possibilidade de me inteirar na relação com o movimento dos fazeres da vida cotidiana. Me via assoberbada, numa busca frenética de algo que pudesse me trazer conforto em tempos pandêmicos. E a resposta estava logo ali, nessa dobra do tempo, nesse espaço em que o tempo paira e a conexão com o mundo ali fora acontece.

Seria idílico pensar que isso aconteceria na contemplação de uma paisagem exuberante, mas aconteceu numa manhã qualquer de um café de shopping da metrópole paulistana. Foi num instante em que me dei conta de que bastava soltar o tempo para que ele pudesse se apresentar por inteiro a mim, me envolvendo num abraço.

Poucos dias antes, meu filho tinha me convocado para uma tarefa inusitada: fazer o nhoque para o almoço do Dia dos Pais. Eu que não sou nenhuma sumidade na cozinha me peguei pensando nos resultados possíveis daquela empreitada, mas seu convite foi tão contundente que não me sobrou espaço de dúvida e aceitei de pronto seu convite. Foram algumas horas, quase toda a manhã, fazendo o almoço com as nossas próprias mãos. Fui aos poucos compreendendo que o objetivo dele não era fazer o melhor nhoque possível ou mostrar seus dotes culinários para quem quer que fosse, era antes de tudo um convite para um fazer junto. O processo foi sem dúvida melhor que o resultado. Pudemos compartilhar o espaço na cozinha, trocar saberes, experimentar dúvidas e aprender, saboreando o tempo juntos. O nhoque valeu bem mais do que qualquer presente comprado, foi um gesto e uma oferta de amor, recebida e degustada por todos com amor.

O espaço de observação dos filhos e de reflexão parental tem me trazido uma musculatura profunda de presença e compreensões cada vez mais interessantes sobre o tempo. Afinal são os pequenos que desde a gestação nos convidam para o resgate do tempo que é próprio do desenvolvimento humano, o tempo da vida. São eles que nos relembram dia a dia que o fio e o tempo da vida seguem e se perpetuam através deles.

Quando capturei aquele instante do tempo no café me senti uma Diana, ‘uma caçadora de tempos de ler o mundo’. Curioso pensar em ‘capturar o tempo’, já que é algo tão insólito que nos escapa tão facilmente pelas mãos, mas talvez seja justamente por isso que tenha brotado o desejo de buscar com o mesmo afinco essa dobra de tempo. Agora compreendendo que esse tempo não acontece pelo esforço infatigável, mas pelo movimento de soltura.

Sincronias a parte, escrevo esse texto na véspera da data em que se cultua a Deusa Diana – 13 de agosto. O que será que essa antecipação quer revelar? Solto a curiosidade para que a mensagem que paira no ar me chegue plena.   

Acordei com tempo para ver o mundo. E me ver por inteira dentro do tempo e do mundo. 

Claudia Worms Taddei, é mãe de dois meninos e acredita que o cuidado que inspira e transpira o ato materno é também um processo de conhecimento de si e uma maneira de nos apropriarmos de nossos recursos internos. Atua com práticas de cuidado e autocuidado (yoga, meditação, constelação, reiki e prática reflexiva) para o público adulto e infanto-juvenil, facilitando o encontro do indivíduo com seu processo de desenvolvimento. Cultiva a Cultura do Cuidado e a Parentalidade Consciente compreendendo que cuidar de si é cuidar do todo.   

@claudia.taddei.yogaeterapia